12 de Setembro, 2009
Ainda sobre o consumo de leite não-materno pelos seres humanos da civilização, algo que os outros humanos nunca fizeram ao longo da sua evolução, pois simplesmente não era possível extrair leite de um animal selvagem
Os artigos que aqui vou colocando poucos comentários recebem (e para começarem a ter também mais atenção, pelos vistos terei de usar muito mais fotos da Rebbeca Romijn), mas excepção à regra foi o artigo "Consumo de leite não-materno será mesmo desejável para uma boa saúde dos seres humanos?", que agora recebeu mais um comentário revelador de um leitor brasileiro. Nesse artigo de 10/Abril apareceu também o Dr. Pedro Bastos a deixar um comentário que, pelo seu elevadíssimo interesse, passo aqui a republicar/citar. O comentário-testemunho do leitor do Brasil, o Sr. Alexandre, consta dos comentários ao citado artigo e pode ser lido aqui.
Comentário do Dr. Pedro Bastos:
(…) A questão do consumo ou não de leite não humano é complexa e não completamente resolvida (aliás, longe disso), tal como tentei mostrar na entrevista.
Todas as patologias da civilização são multifactoriais e aí reside a dificuldade quando se tenta fazer investigação.
No caso dos Masai, por exemplo, há várias considerações a serem feitas:
1) É bem sabido (e as autópsias relatadas pelo george Mann nos anos 70 assim o demonstram) que estes apresentam extensa aterosclerose, mas esta não parece resultar num evento fatal, talvez porque não existem no estilo de vida deste povo outros factores desencadeantes de um evento cardiovascular (como défice de Vitamina D, padrão de sono desadequado, tabagismo, sedentarismo, dieta com carga Glicémica elevada, elevado consumo de óleos vegetais refinados e ricos em ácido linoleico, ácidos gordos trans de origem industrial, que são diferentes dos ácidos gordos trans existentes na carne e leite de ruminantes, elevado rácio w6/w3, consumo de lectinas, alguns glicoalcalóides e saponinas, que hoje se pensa estarem enviolvidos na etilogia da aterosclerose, talvez pelo seu efeito negativo na permeabilidade intestinal e, no caso das lectinas, pelo seu efeito em citoquinas e nas MMPs, etc, etc).
2) Relativamente à questão dos estrogénios no leite bovino, é preciso esclarecer que, à semelhança do que sucede em alguns povos da Mongólia, é muito provável que os Masai e os Samburu não retirem o leite na fase final da gravidez, quando a concentração de estrogénios está mais alta.
3) Como referi, existem estudos epidemiológicos (e quando vários trabalhos apontam na mesma direcção, não devemos desprezá-los) a associar o consumo de leite bovino a diversos carcinomas (sendo a evidência mais forte para cancro da próstata) e são vários os possíveis mecanismos (estrogénios; precursores da DHT; o potencial insulinogénico do leite; IGF-1 no leite, que se supõe ser bastante mais elevado no leite “industrial” [devido a mastite recorrente e ao uso de hormona do crescimento, etc]; Beta-celulina, Cálcio que se pode ligar ao receptor de cálcio e ao receptor de EGF, onde também se liga a Beta-Celulina, etc.).
De qualquer modo, mais uma vez, o consumo de leite bovino num contexto de estilo de vida saudável (o que quer que isso seja, mas presume-se que o estilo primitivo seja substancialmente mais saudável) poderá ser um factor quse desprezível (p.e., no caso do cancro da Próstata, o défice de Vitamina D parece ser um factor muito significativo, o que claramente não é um problema nem para os Masai, nem para os Samburu). Além disso e se pensarmos no IGF-1, sabe-se que este Promove a proliferação celular e a sobrevivência das células tumorais, Facilita angiogénese, malignidade, e metastização e Inibe a destruição de células tumorais quando são alvos de radiação e quimioterapia, MAS NÃO É A CAUSA!!!!
Ou seja, no contexto actual, em que estamos expostos desde cedo a diversos gatilhos desencadeantes da oncogénese, o consumo de leite pdoerá ser significativo, mas numa sociedade que nunca esteve exposto a esses agentes, a ingestão de lacticínios já não representa um perigo “real”.
4) Osteoporose: como refiro no artigo, esta é uma doença multifactorial e complexa, mas mais uma vez a actividade física a Vitamina D parecem ter um papel fundamental.
5) Doenças Auto-Imunes (que é um tema que não desenvolvi na entrevista e que não terei oportunidade de desenvolver aqui): neste caso, pensa-se que o leite possa estar implicado, mas existem outros factores a montante que determinan se um antigénio (neste caso dietético) irá ou não levar à auto-imunidade, como:
a) Factores genéticos (os genes que parecem conferir maior risco para o desenvolvimento da auto-imunidade são os genes do complexo major de histocompatibilidade [MHC], em especial os de classe II, que estão envolvidos na apresentação de antigénios aos Linfócitos TCD4+). Não conheço a distribuição geográfica destes genes em África, pelo que não posso comentar sobre se os Masai têm ou não predisposição genética para a auto-imunidade.
b) Exposição prévia do Linfócitos CD8+ a epítopos (derivados de vírus, por exemplo) que tenham homologia estrutural com autoantigénios. É sabido que muitos vírus que estão implicados em diversas doenças auto-imunes só começaram a ser um problema a partir do Neolítico.
c) Défice de Vitamina D (p.e., verifica-se que a prevalência de Diabetes Tipo 1 é baixíssima em países com maior radiação UV). Mais uma vez, os Masai não parecem sofrer de défice de Vitamina D
d) Hiperpermeabilidade intestinal (os factores dietéticos mais suspeitos neste fenómeno não parecem fazer parte da dieta dos Masai)
e) Reduzido tempo de amamentação e introdução precoce de antigénios dietéticos. É sabido que os Masai amamentam as crianças até cerca dos 2 anos.
(…)
O que gostaria de referir é que para muitos indivíduos que já nasceram e viveram toda a sua vida a seguir um estilo de vida ocidental, o consumo de leite poderá ser prejudicial e só saberemos o quanto, quando começarmos a fazer mais estudos de intervenção (e aqui o uso do template “Paleo” parece ser uma base de trabalho interessante) e a desvendar mais mecanismos para podermos num futuro próximo fazer recomendações mais acertadas.
Autor: Dr. Pedro Bastos, em comentário ao artigo "Consumo de leite não-materno será mesmo desejável para uma boa saúde dos seres humanos?".
E se a Rebbeca Romijn está com uns ossos assim tão bons como ela diz, e parece que sim a julgar por este vídeo, isso dever-se-á ao leite ou será mais pelo facto de andar a apanhar sol em Times Square daquela forma? É que o Sol é fundamental para síntese nossa pele de Vitamina D, a qual por sua vez regula o metabolismo do cálcio em todo o organismo!
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