12 de Novembro, 2010
“Lípidos e imunidade”, um artigo do Dr. Pereira de Moura explorando a associação entre aterosclerose, infecções e inflamação e sua relação com ácidos gordos poliinsaturados
Figura: "LDL oxidation and atherogenesis". Para ampliar, clique aqui.
Fonte: SABIOSCIENCES.
No seu artigo "Lípidos e imunidade", o Dr. Pereira de Moura, médico internista dos Hospitais da Universidade de Coimbra, explora a associação entre aterosclerose, infecções e inflamação e sua relação com ácidos gordos poliinsaturados. Nele explica que a infecção e a inflamação modificam as lipoproteínas plasmáticas, e que a hipertrigliceridemia das reacções inflamatórias produz um aumento da produção das VLDL. De igual modo, ocorre também um enriquecimento das LDL em triglicerídeos e esfingolípidos, tornando-se mais pequenas e densas e, dessa forma, mais susceptíveis à oxidação. As lipoproteínas HDL também não escapam, ocorrendo a sua redução, em quantidade, em capacidade de transporte reverso do colesterol e de protecção antiaterogénica e antioxidativa. O colesterol LDL, actualmente designado de colesterol "mau", também saí vítima no meio disto tudo. Conforme explica o doutor, "O colesterol LDL também sofre as influências da inflamação crónica. Os seus níveis estão geralmente diminuídos, aumentando, no entanto, a concentração das suas sub-classes mais pequenas e densas. Estas pequenas e densas partículas LDL (fenótipo B) são particularmente susceptíveis à oxidação e à internalização pelos macrófagos, através dos “receptores scavenger". O Dr. Pereira de Moura refere que estas várias alterações estarão provavelmente relacionadas com a infecção e inflamação, agentes estes efectivamente potenciadores da aterosclerose e que servem de génese às doenças circulatórias. Na minha interpretação e segundo este perspectiva, acaba por ser a inflamação crónica, potenciada alimentarmente não só pela dieta low-fat oficial, ou por dietas incompreensíveis como a dieta anti-gripe da FCNUP, mas também pelo estilo de vida sedentário/poluído da civilização, a grande responsável pela modelação destes lípidos, que se limitam a "responder" ao meio ambiente desfavorável em que se encontram. Como? Degradando-se, isto é, tornando-se mais ou menos aterogénicas. Se assim for, então o mais lógico será obviamente actuar preventivamente, a montante destas consequências, identificando/eliminando os factores que conduzem à inflamação crónica, e não tanto tentando modificar lípidos produzidos pelo nosso próprio corpo farmacologicamente, por exemplo através de estatinas. Este meu raciocínio faz algum sentido? Este artigo termina com esta conclusão, muitíssimo acertada e a ter em grande conta:
"A mudança radical da dieta humana, com predomínio franco dos ácidos gordos polinsaturados ómega-6 relativamente à dieta dos nossos antepassados, será muito provavelmente, uma das razões para o aumento da doença cardiovascular verificado nos países ocidentais".
in "Lípidos e imunidade", Dr. Pereira de Moura
Medicina Interna, Vol. 10, n. 1, 2003.
Apesar da enorme complexidade do tema das doenças cardiovasculares, este artigo identifica claramente factores reais conducentes a essas doenças circulatórias. "A inflamação crónica é um forte factor de risco para a doença cardiovascular, embora os mecanismos subjacentes a esta associação estejam longe de estar completamente esclarecidos". A principal conclusão a extrair deste artigo, parece-me, é a de que o rácio ómega-3 / ómega-6, actualmente totalmente ignorado nas recomendações de saúde, possuirá uma importância enormíssima, mesmo extraordinária. Basta notar, por exemplo, que os portugueses têm hoje quase 20% de ómega-6 no seu tecido adiposo, enquanto em tempos primitivos/ancestrais essa percentagem seria muitíssimo inferior, talvez nos 5-10%. Tendo em conta que o tempo de residência dos lípidos no corpo humano deve rondar os 600 dias (li isto no livro "Omega Six - The Devils Fats", de Robert A. Brown; pode ler o prefácio deste livro aqui), é de esperar que quanto mais instáveis/poliinsaturados esses lípidos forem, maior propensão haverá para a sua degradação/rancidez no corpo e, consequentemente, para a instalação de diversas patologias, como por exemplo o cancro (doença com génese inflamatória?). Por acaso você já ouviu falar de peroxidação lipídica? Se não, então leia este artigo do Whole Health Source e ficará pasmado com o facto do sol poder literalmente fritar os nossos lípidos epidérmicos, que são tanto mais vulneráveis quanto menos saturados forem. Mas as gorduras saturadas fazem muito mal à saúde, devemos evitá-las a todo o custo. "Hoje sabe-se que o consumo de gorduras saturadas está relacionado com o aumento crescente de doenças ditas da civilização ou degenerativas", não é o que eles dizem? Por outras palavras, não faz grande sentido acreditarmos que podemos alterar radicalmente a estrutura lipídica do nosso corpo, através da introdução de alimentos industrializados/desconhecidos da nossa fisiologia paleolítica, sem esperar que isso possa ter algumas/muitas(?) consequências adversas. Ou seja, e para concluir, o mais certo é que o consumo elevado de certos alimentos modernos ricos em ómega-6, designadamente os recém-introduzidos cereais/trigo, óleos vegetais e margarinas "saudáveis", não nos deve fazer propriamente muito bem à saúde. Mas os especialistas modernos recomendam que os consumamos em grandiosa abundância, até afirmam inequivocamente que "óleos vegetais têm os ácidos gordos que mais protegem o coração”. Vamos fazer o quê perante estas incongruências?
Lípidos e imunidade
Pereira de Moura
Assistente Hospitalar Graduado de Medicina Interna, Serviço de Medicina, Hospitais da Universidade de CoimbraMedicina Interna, Vol. 10, n. 1, 2003
Resumo
Diversos dados epidemiológicos sugerem uma relação entre a aterosclerose e os processos infecciosos e inflamatórios crónicos. Significativas alterações no metabolismo proteico e lipídico acompanham as reacções infecciosas e inflamatórias, constituindo a clássica resposta de fase aguda (RFA). A RFA pode perturbar o metabolismo das lipoproteínas, traduzindo-se por alterações qualitativas e quantitativas destas partículas plasmáticas. Por sua vez, os lípidos podem, através do seu metabolismo, influenciar a síntese de diversos e importantes mediadores inflamatórios, os eicosanóides. Com base nestas constatações, tem-se procurado alterar favoravelmente o curso de várias doenças infecciosas e inflamatórias através da manipulação dietética, particularmente a nível da composição em ácidos gordos polinsaturados.
Palavras chave: Inflamação, infecção, ácidos gordos polinsaturados (PUFA), eicosanóides, aterosclerose
Download: lipidos-e-imunidade-pereira-de-moura.pdf