Canibais e Reis

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09 de Junho, 2009

Estudo científico português associa a um MAIOR consumo de gorduras, sejam elas saturadas, monoinsaturadas ou polinsaturadas, portanto a gorduras de QUALQUER tipo, e também a uma MAIOR ingestão de colesterol, um MENOR risco de acidente vascular cerebral isquémico

Autor: O Primitivo. Categoria: Dieta| Mitos| Saúde

Gorduras e colesterol afinal não causam AVC?

Da ACTA MÉDICA PORTUGUESA, II Série, Vol. 20, N.º 4, de Julho/Agosto 2007, consta um estudo epidemiológico "obscuro" de grande interesse, intitulado "Gordura alimentar e risco de acidente vascular cerebral isquémico no Norte de Portugal" e conduzido pelo Serviço de Epidemiologia da Faculdade de Medicina do Porto e Faculdade de Ciências da Nutrição e Alimentação da Universidade do Porto. Este estudo caso-controlo, com entrada na Pubmed nr. 18198074 e que pode ser lido aqui, em português, teve por objectivo pioneiro estabelecer a associação de consumo de gorduras com AVC isquémico na população portuguesa. Para o efeito, avaliou 297 indivíduos de ambos os sexos, internados no Hospital de S. João, no Porto, com primeiro episódio de AVC isquémico, grupo que foi comparado com um grupo de controlo.

De acordo com os autores, verificou-se que "quartis crescentes de lípidos totais, de ácidos gordos monoinsaturados (AGM), AGP, AGS e de colesterol são factores protectores independentes, à excepção do consumo de gorduras trans, a que associaram maior risco de AVC isquémico. A ingestão de ácido oleico [azeite] e linolénico só revela protecção significativa nas mulheres, enquanto a ingestão da totalidade de ácidos gordos (AG) n-3 e particularmente do ácido dodecohexanóico revelam protecção significativa em ambos os sexos. A totalidade dos AG n-6 e o ácido linoleico também se associam inversamente com o risco de AVC isquémico nas mulheres".

Os autores concluiem que, e passo a citar, que "a ingestão de gordura total, de AGS, AGM e de AGP associa-se a menor risco de AVC isquémico. Pelo contrário, a ingestão de AG trans associa-se a maior risco". Será caso para perguntar já, então afinal, gorduras e colesterol alimentar, ao contrário do que os especialistas nos dizem, não entopem tudo e causando AVC isquémico?

 

Associação epidemiológica e causalidade

Em primeiro lugar, acho extraordinário os autores terem excluído das conclusões principais o colesterol, apesar deste não  ser quimicamente um lípido, eu sei, sendo facto incontornável que existe uma associação negativa entre colesterol alimentar e risco de AVC isquémico, ou seja, quanto mais colesterol alimentar, menor risco de AVC. E para quem ainda não reparou ou não sabe, AGS significa gorduras saturadas! Ui, ui, sim, aquelas mortais para o sistema cardiovascular! Eu entendo que estes resultados epidemiológicos possam ser muito desconcertantes, para os menos informados. Com efeito, dada a actual campanha existente no meio nutricional, promovida por vários lóbies de interesses (dos vegetarianos, dos cereais, etc.) que, em função das suas agendas, pretendem crucificar o consumo das gorduras alimentares, designadamente das saturadas, atribuindo-lhes a responsabilidade das doenças cardiovasculares, hoje em dia já ninguém será capaz de acreditar que as dietas hiperlipídicas, na realidade, são cardioprotectoras. É impensável, pois claro.

Mas até existe muita ciência, bastante credível, que aponta nesse sentido, já para não falar da evidência epidemiológica. Já expliquei neste blogue que a associação estatística entre duas variáveis não significa necessariamente causalidade (sugiro leitura deste artigo didáctico muito bom, sobre epidemiologia). Mas também é verdade que faz todo o sentido, antes de se proceder à realização de ensaios clínicos, basear a formulação de hipóteses na melhor evidência epidemiológica disponível. Ora, o estudo epidemiológico aqui referido, tal como muitos outros similares, encontrou uma associação negativa entre todos os tipos de gorduras, excepto as trans, e também do colesterol alimentar, com o risco de AVC. Ou seja, quanto mais gorduras, menos AVC. Ou quanto menos dos alimentos substituídos por gorduras (cereais "saudáveis" de alto IG?), menos AVC. Partindo desta evidência, poderíamos por exemplo estudar o efeito das gorduras saturadas na saúde cardiovascular e assim por diante. Mas isto já foi feito, e as conclusões também apontam no mesmo sentido: a gordura saturada é inocente. Eu sei que isto é inacreditável mas, por um momento apenas, ponha os olhos na ciência e ignore a publicidade!

 

Ideias à priori, um vicio inevitável?

Todos os estudos são, em maior ou menor medida, viciados por ideias à priori. Isto como que faz parte da condição humana, não há método científico-cartesiano que lhe valha. Em maior ou menor medida, estas ideias influenciam ou podem até determinar os seus resultados finais. Por exemplo, neste estudo são notórios alguns medos típicos que os defensores das dietas low-fat e da hipótese lipídica conseguiram implantar na mente dos investigadores. Por exemplo, é dito que "a ingestão de lípidos e o tipo de lípidos têm interesse por causa da sua relação com aterosclerose e doença coronária", o que, me parece, configura a ideia à priori de que gorduras poderão ser causadoras de doença coronária. Trata-se de uma hipótese contestada por muitos investigadores inteligentes, a qual, apesar de muitas décadas de pesquisa, ainda não foi provada, e provavelmente nunca o chegará a ser, até porque, como está à vista, até a evidência epidemiológica aponta exactamente no sentido oposto, o de que as gorduras alimentares, de qualquer tipo, são efectivamente cardioprotectoras.

Num outro artigo deste blogue, sobre a mortalidade cardiovascular na Europa, que pode ser lido aqui, especulei precisamente acerca desta hipótese, que julgo sair agora reforçada por este estudo português, referindo que "face ao dados de que disponho, para já, estou em crer que a quantidade [de gorduras] até é mais relevante que a qualidade (Pensar isto é muito polémico, bem sei meus caros amigos, mas poderei evoluir nas ideias em breve)". Entenda-se que esta afirmação tem necessariamente de ser considerada no contexto da hipótese que formulei nesse artigo, e que era a seguinte: "Nas condições hipercalóricas da civilização, o consumo preferencial de gorduras, por oposição ao de hidratos de carbono [de alto IG], constitui um factor relevante na diminuição do risco cardiovascular". Acredito que para indivíduos com peso adequado, esta relevância das gorduras será muito menos significativa, porventura passando a interessar mais o tipo que propriamente a quantidade das mesmas.

Em minha opinião, outras referências poderiam ser igualmente interpretadas como indiciadoras de ideias à priori, como por exemplo o fazer questão de referir que "O contributo energético dos lípidos foi inferior a 30%, sendo menor que 10% o de ácidos gordos saturados (AGS) e o de ácidos gordos polinsaturados (AGP), mas com níveis de colesterol, nos homens, superiores a 300 mg". Mas não vou explorar mais estes aspectos relacionados com a "mitologia" das gorduras e do seu papel na saúde cardiovascular, até porque não é esse o objectivo deste artigo. Acredito que as conclusões seriam as mesmas para 40% da energia em lípidos, 50% ou até mais, até ao limite de uma dieta cetogénica razoável. Idem para AGS e colesterol, desde que em quantidades também razoáveis. Adiante.

 

Metodologia e resultados do estudo

As informações de ingestão alimentar foram obtidas por questionário, as quais foram posteriormente convertidas em nutrientes, conforme explicado no estudo. "Para estimar a associação entre as exposições e a ocorrência de AVC isquémico, categorizaram-se algumas das variáveis independentes. Calcularam-se riscos relativos (OR) com intervalos de confiança a 95% para avaliação da associação entre factores de risco e o AVC isquémico. Relativamente à ingestão alimentar, distribuíram-se os participantes por quartis de ingestão, tendo por referência o quartil dos controlos com valor inferior. Os nutrientes foram avaliados em bruto e após ajuste para a energia total ingerida. O efeito independente de cada nutriente em estudo foi então determinado com ajuste para a ingestão energética total, bem como para as covariáveis com evidência epidemiológica ou biológica ou variáveis de confusão em análise univariada".

No que respeita aos resultados, verificou-se que "os casos [vítimas de AVC] apresentam ingestões significativamente inferiores de proteínas, lípidos totais, ácidos gordos saturados (AGS), nomeadamente láurico, mirístico, palmítico e esteárico, ácidos gordos monoinsaturados (AGM) e ácidos gordos polinsaturados (AGP), nomeadamente ácido linoleico, ácidos gordos n-3, colesterol e vitamina E. Os casos do sexo masculino apresentam ainda ingestões significativamente inferiores de ácido linolénico e de ácido docosahexanóico (DHA) e os do sexo feminino de energia e de ácido oleico e ácido icosapentanóico (EPA)".

 

Verificou-se ainda que "os casos ingerem proporções significativamente inferiores de proteínas, lípidos totais, AGS, AG n-3 e significativamente superiores de etanol. Os casos do sexo masculino apresentam também ingestões significativamente inferiores de AGM e AGP. Pelo contrário, os do sexo feminino revelam ingestões significativamente superiores de AGtrans. Deve ainda salientar-se que, na nossa amostra, as proteínas têm um contributo energético superior a 15% mas inferior a 20%, os lípidos totais têm um contributo energético inferior a 30%, sendo inferior a 10% o de AGS e o de AGP, e com níveis de colesterol superiores a 300 mg nos homens".

 

Uma conclusão, a meu ver, bastante importante, é a de que "à ingestão de proteínas e glícidos associa-se a diminuição do risco de AVC isquémico, em ambos os sexos. Esta protecção mantém-se quando se ajusta para a ingestão energética, idade e escolaridade, ou para outras variáveis confundidoras, intervenientes ou não na cadeia causal. Uma maior ingestão de lípidos totais, AGP e AGS revela-se protectora para o AVC isquémico em ambos os sexos. Nas mulheres, a ingestão de AGM e de colesterol correspondente ao quarto quartil também se associa inversamente com a doença. Quando se ajusta para outras variáveis, para além da idade, escolaridade e da energia total ingerida, com possíveis passos intermédios na cadeia causal esta associação inversa mantém-se para todos eles e, no caso das mulheres, o consumo de AGM também se associa a diminuição do risco".

No que respeita aos ácidos gordos em detalhe, é confirmado o papel protector dos ácidos gordos láurico, mirístico, palmítico e esteárico em ambos os sexos. É de notar que o ácido esteárico é a principal gordura saturada da carne. O quadro abaixo, porventura dos mais importantes deste estudo, representa os riscos de AVC isquémico em função dos quartis de alguns ácidos gordos. O primeiro quartil é o de referência, equivalendo-lhe por isso um risco unitário, igual a 1. É curioso verificar que os riscos encontrados não são sempre decrescentes ou crescentes conforme o quartil, ocorrendo no caso dos lípidos totais um máximo relativo para o 3º quartil, apesar de tudo inferior à unidade. Eu não entendo este comportamento, se alguém souber explicar, faça favor. De qualquer forma, é muito notório que ao consumo acrescido de todos os tipos de lípidos, inclusive de gorduras SATURADAS, e também de colesterol alimentar está associado menor risco de AVC. Qual será a explicação dos "especialistas" anti-gorduras para esta evidência epidemiológica? Haverá alguma explicação ou será que vamos entrar em negação da realidade?

 

Artérias entupidas por cereais "saudáveis"?

Para controlar o confundimento produzido pela energia consumida, na investigação em questão optou-se pelo método dos resíduos para obter uma medida do nutriente ingerido que não se correlaciona com a energia total ingerida. Este método alegadamente permite estimar independentemente das variações de energia o possível papel de alguns nutrientes como factores de risco para o AVC isquémico. Por este método constatou-se que "à ingestão de proteínas se associava inversamente ao risco de AVC isquémico, em ambos os sexos. Esta protecção manteve-se mesmo após ajuste para factores de risco clássicos".

Foi também constatado que "todos os ácidos gordos aumentam mais o colesterol das lipoproteínas de alta densidade (HDLc) do que os glícidos, mas este efeito diminui com o aumento da insaturação. A substituição de AGS e AG trans por glícidos, em vez de AGI, deverá baixar não só o COL e o colesterol das lipoproteínas de baixa densidade (LDLc) mas também o HDLc. Está descrito, comovimos, que substituir numa dieta parte dos lípidos por glícidos poderá torná-la mais aterogénica". Tanto quanto eu sei, sinónimo de aterogénico é ficar com as artérias entupidas e por isso com riso acrescido de doença cardiovascular. Mas então, não são as gorduras que entopem as artérias, são os glícidos? O que é isto de glícidos, será o mesmo que hidratos de carbono, provavelmente daqueles de alto IG, que são a base da pirâmide oficial alimentar? Por acaso, este estudo português também revela que "um estudo recente demonstrou que a ingestão de uma dieta rica em glícidos elevava os níveis de triglicerideos (TG), como resultado da redução do clearance das lipoproteínas de muito baixa densidade (VLDL). A mesma dieta administrada a indivíduos moderadamente hiperinsulinémicos retardou não só o clearance das VLDL como dos quilomicron sem afectar a produção de TG".

No que respeita ao consumo de fibra, que tantas autoridades também apregoam ser uma coisa muito saudável, mas ideia sobre a qual também não existe consenso científico, verificou-se que "quartis crescentes do consumo de fibra dietética (celulose, hemicelulose, linhina, pectina, goma, mucilagense polissacarídeos derivados de algas) também se revelaram protectores para a doença cerebrovascular isquémica,mas revelando apenas significado estatístico nas mulheres. Desconhecem-se outros trabalhos que tenham investigado o efeito destes nutrientes no AVC isquémico". Ou seja, não foi identificado qualquer efeito claramente protector nos homens e, diga-se em abono da verdade, também nada de espectacular no caso das mulheres. A propósito de fibras, é referido que "Há evidência de que as dietas vegetarianas possam baixar a pressão arterial. Estas dietas são hipolipídicas (1,0) e elevada quantidade de fibras (20-50 g/dia), frutos e produtos hortícolas". Este lóbie vegetariano é, de facto, muito poderoso, consegue infiltrar as suas ideias líricas em todos os lados, mesmo num estudo desta natureza, que associa nitidamente dietas hiperlipídicas a menor risco de AVC. Haverá alguma vantagem em consumir alimentos ricos em fibra, ou isso é apenas mais outro mito urbano? A minha intuição diz-me que o consumo de fibras deve ser quase irrelevante para a saúde em geral, mas não estou certo disto. Barry Groves, um membro da THINCS, até diz que aumenta o risco de cancro, vejam só!

 

Principais conclusões deste estudo

A conclusão principal deste estudo epidemiológico, no qual se comparam casos de AVC isquémico com um grupo de controlo, foi, "no que diz respeito aos lípidos, [que] quartis crescentes de lípidos totais, de AGM, AGP, AGS e de colesterol revelaram-se protectores para a doença cerebrovascular isquémica, mesmo após ajuste para outros factores de risco". Vou repetir, porque nunca é demais, AGS significa gorduras saturadas. Inclusivamente, neste estudo o AG esteárico da carne associou-se inversamente com a pressão arterial diastólica (PAD). É também proposto que "os resultados deste estudo vêm corroborar resultados de outras investigações, que sugerem que o mecanismo fisiopatológico do AVC isquémico deve ser diferente do mecanismo clássico da doença coronária". Os autores cautelosamente concluem referindo que "estudos observacionais que relacionam alimentos e doença não possuem evidência suficiente que permita o estabelecimento de causalidade".

Estudos deste tipo deveriam ser suficientes para certos investigadores mergulharem na literatura e concluírem, por exemplo, que são absolutamente diminutos os estudos científicos controlados demonstrando causalidade entre consumo de gorduras saturadas e doença cardiovascular. Na realidade, são inúmeros os estudos de intervenção que não conseguiram estabelecer qualquer nexo de causalidade entre gorduras saturadas e doença cardiovascular, e diminutos os estudos "provando" o contrário. No entanto, este mito das gorduras saturadas persiste, fruto da errada hipótese lipídica do Dr. Ancel Keys, é certo que em declínio face a toda a nova ciência entretanto publicada, enfatizando a vertente inflamatória da doença cardiovascular, em detrimento da teoria puramente "acumulatória". Ou seja, uma dieta de chispes e couratos, muito rica em gorduras, designadamente de origem animal, carregada de "horrorosas" gorduras saturadas, estando muito mais próxima de uma dieta primitiva do que, por exemplo, qualquer dieta oficial moderna low-fat, baseada na "saudável" roda oficial dos alimentos, é muito mais cardioprotectora do que estas últimas. Por outras palavras, depois de tanta desinformação, promovida nomeadamente pelo lóbie vegetariano, é difícil de acreditar que a nossa dieta ancestral, carregadas de gorduras saturadas da carne/peixe/ovos, afinal, até é capaz de ser muito saudável?

Concluo relembrando algo que escrevi no artigo "Variabilidade regional da mortalidade cardiovascular na Europa ou como os povos mais protegidos são justamente os mais gordurosos", e que mantenho na minha linha de raciocínio: "Repare-se ainda que o que aqui está em causa não é necessariamente o efeito cardioprotector das gorduras, que até pode nem existir, mas antes o efeito nocivo para o sistema cardiovascular das dietas hiperglicémicas e de elevada insulina da civilização, baseadas nos muitos cereais /amidos integrais "saudáveis" recomendados pelas modernas autoridades de saúde, apesar dos mesmos nunca terem feito parte da alimentação humana ao longo da sua evolução". É muito importante reter que é quase impossível atribuir causalidade isolada a determinado nutriente, pelo simples facto de que os alimentos funcionam sempre por substituição.

E agora fazer entender tudo isto aos nossos "especialistas" em nutrição e saúde, será que eles atingem?

 

Gordura alimentar e risco de acidente vascular cerebral isquémico no Norte de Portugal

Introdução: Alguns estudos internacionais sugerem a existência de uma associação inversa entre o consumo de lípidos e o risco de acidente vascular cerebral (AVC) isquémico. Ao contrário da doença coronária, apenas 10% a 15% dos AVCs isquémicos se relacionam com a aterosclerose dos grandes vasos. Isto leva a supor a existência de mecanismos diferentes para as duas patologias. Assim, desenvolveu-se um estudo com o objectivo de quantificar o risco de AVC isquémico em relação com a ingestão de lípidos. População e Métodos: Estudo caso-controlo, que incluiu 297 indivíduos de ambos os sexos, internados no Hospital de S. João – Porto, com primeiro episódio de AVC isquémico. Avaliou-se também um grupo de 671 controlos, de ambos os sexos, seleccionados por aleatorização de números de telefone. Todos os participantes residiam na área geográfica de influência do Hospital de S. João, tinham idade igual ou superiora 44 anos, eram de raça caucasiana, sem alterações cognitivas e não tinham modificadoos seus hábitos alimentares no último ano. As informações foram obtidas através de um questionário estruturado, de administração indirecta, que compreendia questões sócio-demograficas, antecedentes pessoais e familiares de doença e características comportamentais (actividade física, hábitos tabágicos, hábitos alimentares). A ingestão alimentar foi avaliada pela aplicação de um questionário semi-quantitativo de frequência de alimentos. Para o cálculo das estimativas do risco relativo (odds ratio) e respectivos intervalos de confiança a 95% aplicou-se a análise de regressão logística, de acordo com modelos estratificados por sexo. Resultados: O contributo energético dos lípidos foi inferior a 30%, sendo menor que 10% o de ácidos gordos saturados (AGS) e o de ácidos gordos polinsaturados (AGP), mas com níveis de colesterol, nos homens, superiores a 300 mg. Concomitantemente, verificamos que quartis crescentes de lípidos totais, de ácidos gordos monoinsaturados (AGM), AGP, AGS e de colesterol são factores protectores independentes. Contudo, o consumo de ácidos gordos com configuração trans aumenta o risco de AVC isquémico. A ingestão de ácido oleico e linolénico só revela protecção significativa nas mulheres, enquanto a ingestão da totalidade de ácidos gordos (AG) n-3 e particularmente do ácido dodecohexanóico revelam protecção significativa em ambos os sexos. A totalidade dos AG n-6 e o ácido linoleico também se associam inversamente com o risco de AVC isquémico nas mulheres, contudo revelam tendência para se associarem directamente com a doença cerebrovascular isquémica nos homens. Conclusão: A ingestão de gordura total, de AGS, AGM e de AGP associa-se a menorrisco de AVC isquémico. Pelo contrário, a ingestão de AG trans associa-se a maior risco.

 

Fonte: Acta Médica Portuguesa.

 

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